A cultura na resposta da crise climática, no Amazonas

O papel do ‘Até o Tucupi 2024, Festival pelo Clima’ no enfrentamento da crise climática em um dos estados mais impactados pelas mudanças do clima. De 20 a 30 de novembro, Manaus transformou-se em um espaço de resistência, conexão e mobilização com a realização do ‘Até o Tucupi 2024, Festival pelo Clima’. Em um dos estados mais impactados pela crise climática no Brasil, o evento reafirmou a cultura como ferramenta de transformação social e ambiental. Contando com 62 grupos e movimentos envolvidos em 27 atividades culturais e políticas espalhadas por toda a cidade, o festival, em sua décima sétima edição, consolidou-se como uma plataforma que transcende a celebração artística, promovendo debates e mobilizações em prol da justiça social e climática. Inspirado pela pedagogia de Paulo Freire, que defendia a cultura como um processo dinâmico e coletivo para desnaturalizar opressões e transformar desigualdades, o festival materializou essa visão ao reunir vozes e territórios em ações concretas. Freire argumentava que a cultura não é apenas uma expressão de identidade, mas também um caminho para resistência criativa e para a construção de um mundo mais justo. No ‘Até o Tucupi 2024’, essa resistência foi traduzida em iniciativas como o Tribunal Popular Climático, realizado no dia 29 de novembro, no Parque dos Bilhares, em Manaus. O evento responsabilizou o poder público pelos impactos da crise climática e expôs a negligência institucional diante de uma emergência ambiental sem precedentes. “O Tribunal Popular Climático reforçou a mensagem de que a mudança climática é um problema estrutural, que exige respostas ancoradas na justiça climática e na defesa dos povos da Amazônia”, ressaltou Alessandrine Silva, advogada da Associação de Advocacia Popular do Amazonas, que apoiou a condução do tribunal. A coordenadora da Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e Entorno (COPIME), Marcivana Sateré Mawé, destacou: “A cultura é nossa maior arma para transformar realidades e enfrentar crises. Ela nos ajuda a compreender nossa diversidade, encontrar caminhos e exigir respostas concretas do Estado.” Marcivana capturou a essência do Até o Tucupi 2024 que reflete a centralidade da cultura como ferramenta histórica nas lutas por transformação social. Complementando as mobilizações do tribunal popular, a ‘Marcha Até o Tucupi Pelo Clima’ reuniu 150 pessoas em um ato, que percorreu as avenidas Constantino Nery e Djalma Batista, reafirmou demandas urgentes por justiça social e ambiental. O festival também trouxe uma mensagem contundente: adaptar-se à crise climática não significa aceitar passivamente as desigualdades e a degradação. O grito pelo clima do festival é o documento “Não Há Mais Tempo!”, que destacou que os debates sobre adaptação às mudanças do clima precisa ser um caminho de luta e transformação, rejeitando a normalização de uma realidade insalubre imposta por modelos de exploração predatórios. Essa ideia permeou diversas atividades do festival, conectando as questões climáticas às lutas por justiça social e defesa dos territórios. “Não há mais tempo! O Grito Até o Tucupi é mais do que palavras. É um chamado à ação. É a força coletiva que não se cala, que dança, canta, marcha e constrói. Resistir é viver. E viver é transformar.” Destaca trecho do documento. Acesse o material completo AQUI CRISES O Amazonas vive o impacto cruel da crise climática: secas severas comprometem a subsistência de comunidades inteiras, rios atingem níveis históricos de baixa, e a fumaça das queimadas torna o ar irrespirável. Em 2024, mais de 747 mil pessoas foram diretamente afetadas pela estiagem, com 24.700 pontos de queimadas registrados no estado. Manaus, por sua vez, enfrenta níveis alarmantes de poluição e a ausência de políticas públicas que enfrentem essa realidade. Os dados do boletim “Amazônia à Beira do Colapso”, da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), retratam a gravidade da emergência climática em todos os estados da Amazônia. Em 2024, a seca extrema atingiu 315 mil km², afetando diretamente 42 territórios indígenas, 3 mil domicílios e dezenas de escolas e unidades de saúde. Além disso, o estado registrou 24.700 pontos de queimadas, agravando a crise de poluição do ar e a escassez hídrica. Em um comparativo, a seca extrema em julho de 2023 atingiu 15 mil km² ou 1,5 milhão de hectares. Já a seca extrema de 2024 atinge atualmente 315 mil km² ou 31 milhões de hectares, uma área equivalente ao tamanho da Itália, indicando aumento de 2000% em relação às áreas afetadas pelo processo de seca extrema. Em resposta a esse cenário, o festival tornou-se um espaço de formação e solidariedade. Oficinas culturais em escolas conectaram jovens à agenda climática por meio de música, arte e debates. No dia 21 de novembro, adolescentes da Escola Estadual Cacilda Braule Pinto participaram de apresentações da cantora Elisa Maia e do grupo de rap Bruxos do Norte, que destacaram narrativas da Amazônia e os desafios climáticos. A oficina Clima e Juventude, em parceria com o coletivo Perifa Amazônia, trouxe a agenda climática para o centro do debate, promovendo batalhas de rima. No dia 22 de novembro, o Centro de Educação Escolar Indígena Wakenai Anumareith, localizado no bairro indígena Parque das Tribos, recebeu o Festival Até o Tucupi para intercâmbios culturais. As atividades incluíram a apresentação do Grupo Kariçu e a performance Eu Sou a Amazônia, de Joel Sateré Mawé, que celebraram as culturas indígenas e destacaram o protagonismo comunitário nas soluções climáticas. Essas iniciativas em espaços de ensino reafirmaram o compromisso do festival com a formação crítica, o resgate de saberes tradicionais e o fortalecimento de redes de resistência. Escolas e comunidades são espaços de transformação e mobilização, ampliando a luta por justiça na Amazônia. O festival foi feito com muitas alianças e uma delas foi com o fortalecimento da campanha Água é Vida, Doe Vida!, arrecadando alimentos não perecíveis e água potável durante o encerramento do Até o Tucupi, no Centro Cultural Povos da Amazônia. A campanha, uma resposta à pior seca dos últimos 120 anos, reforçou a solidariedade com as comunidades impactadas, conectando esforços de diversas instituições e movimentos sociais. Essa campanha é organizada por instituições comprometidas com a luta por justiça socioambiental: MAB, Cáritas, Arquidiocese de